O cimento é um material essencial para a economia moderna. Com o seu baixo custo e caraterísticas duradouras, é difícil imaginar um cenário em que este possa ser substituído em grande escala – o que significa que este material terá um papel contínuo na economia de baixo carbono do futuro. Numa perspetiva geral, a indústria do cimento assistiu a uma transformação significativa na última década. Após anos de concentração no crescimento do volume e na expansão da presença no mercado, a crise financeira global de 2008 alterou permanentemente o panorama do setor, uma vez que a recuperação total da procura nunca se concretizou.
Confrontada com fracos retornos, a indústria do cimento começou a consolidar-se em meados da década de 2010. Isto marcou o início da disciplina de mercado, refletida num poder de fixação de preços consistente e numa estratégia de valor sobre o volume para as principais empresas de cimento.
Este poder de fixação de preços resultou, em parte, da natureza local da produção de cimento. O cimento tem uma estrutura de “carácter local”, sendo esta uma caraterística que o diferencia de outros produtos de base cíclicos. Embora este setor não tenha ficado imune aos grandes impactos sofridos nos últimos anos – nomeadamente a Covid-19, o colapso do setor da construção, a crise energética na sequência da invasão russa da Ucrânia e o consequente aumento das taxas de juro -, a abordagem disciplinada da indústria de valor sobre o volume manteve-se firme, com preços resilientes capazes de compensar estas pressões.
A próxima década será mais uma fase de evolução para o setor, à medida que as empresas da indústria cimenteira enfrentam o impacto dos custos do carbono e os desafios da descarbonização. Isto irá transformar novamente o setor, levando a volumes estruturalmente mais baixos, curvas de custo mais acentuadas, mercados ainda mais localizados e mais racionalização da capacidade.
A produção de cimento é responsável por cerca de 8% das emissões globais de CO2 e a produção de cimento Portland – o tipo mais comum de cimento – começa com a moagem de matérias-primas como o calcário e a argila num pó fino. Este pó é depois aquecido a uma temperatura que pode atingir os 1450°C num forno de cimento.
Normalmente, as fábricas de cimento utilizam carvão, coque de petróleo (petcoke) ou gás natural para aquecer o forno. Só o processo de aquecimento é responsável por cerca de 40% das emissões em todo o processo de produção. Os restantes 60% são provenientes do processo químico: uma vez que o carbono libertado pelo calcário aquecido passa pelo forno, transforma-se num material chamado clínquer, o elemento-chave do cimento. Esta é a fase de maior consumo de energia na sua produção.
Para descarbonizar uma fábrica de cimento, podem ser utilizadas três estratégias. Em primeiro lugar, a utilização de substâncias alternativas para reduzir o consumo de energia e as emissões de CO2 associadas à produção de clínquer. Em seguida, utilizar fontes de energia alternativas para reduzir as emissões de CO2 resultantes da combustão de combustíveis. Finalmente, utilizar tecnologias de captura, utilização e armazenamento de carbono (carbon capture, utilisation and storage, ou CCUS), para controlar as emissões diretas inevitáveis provenientes da transformação do calcário em clínquer de cimento.
Existem vantagens para os líderes europeus serem pioneiros na redução das emissões de cimento: não só faz sentido do ponto de vista ambiental, como também representa uma oportunidade financeira cada vez mais atrativa, sobretudo na Europa. Nesta ótica, esperam-se benefícios de projetos pioneiros para as empresas de cimento capazes de descarbonizar mais rapidamente.
Em termos de ações, os princípios fundamentais da indústria são subestimados pelo mercado, e não se refletem devidamente nas avaliações atuais. As ações europeias do setor do cimento sofreram uma desvalorização significativa nos últimos cinco anos, em grande parte devido a preocupações quanto à estratégia de descarbonização. Dentro da indústria do cimento, continuaremos a identificar oportunidades de investimento atrativas nos atuais líderes da descarbonização, bem como em organizações com potencial para mostrar mais ambição e credibilidade em estratégias net-zero.